A prática de “vestir-se socialmente” para ir à igreja é um fenômeno relativamente recente. Começou pelo final do século XVIII com a Revolução Industrial e chegou a ser bem difundido nos meados do século XIX. Nessa época, “vestir-se bem” para eventos sociais era algo usual somente entre os ricos. A razão era simples. Apenas ricos aristocratas da sociedade poderiam comprar roupa bonita! As pessoas comuns somente tinham dois jogos de roupa: Roupa para trabalhar no campo e roupa menos andrajosa para se misturar com o povo. [2]
“Vestir-se bem” para alguma ocasião era opção apenas para a nobreza rica. [3] Na Europa medieval, até o século XVIII, “vestir-se bem” era a marca definitiva da classe social de alguém. Em países como a Inglaterra, as pessoas pobres eram proibidas de vestir o tipo de roupa que as pessoas “bem de vida” usavam.[4] Isto mudou com a invenção das grandes fábricas têxteis e o desenvolvimento da sociedade urbana.[5] As roupas finas tornaram-se mais acessíveis às pessoas comuns. A classe média surgiu e seus membros começaram a rivalizar com a aristocracia invejosa. Pela primeira vez a classe média pode distinguir-se dos camponeses. [6] Para demonstrar sua recente condição de ascensão social, eles passaram a exibir “roupas melhores” nos eventos sociais como os ricos faziam. [7]
Alguns grupos de cristãos no fim do século XVIII e início do século XIX resistiram a esta tendência cultural. John Wesley escreveu contra o uso de roupa cara ou extravagante. [8] O Metodista primitivo resistia tanto à idéia do uso de “roupas finas” na igreja que repreendia qualquer um que exibisse roupa cara nas reuniões. Os batistas primitivos também condenaram o uso de roupa fina, achavam que ela separava ricos de pobres. [9]
Apesar desses protestos, o cristão quando podia vestia-se com roupa fina. A classe média prosperou, mudou-se para grandes mansões, construiu grandes edifícios de igreja e passou a usar roupa ainda mais fina. [10] Com o desenvolvimento da cultura vitoriana de classe média, as igrejas começaram a atrair pessoas mais influentes da sociedade. [11] Isto fez com que igrejas mais comuns como Metodistas, Batistas, etc., trabalhassem mais duro para manter seus próprios edifícios. [12]
Tudo isso chegou a um ponto crítico quando em 1843, Horácio Bushnell, um pastor influente da Igreja Congregacional do Estado de Connecticut, publicou um texto chamado Taste and Fashion. Nele Bushnell argumentava que sofisticação e refinamento eram atributos divinos e que os cristãos precisavam demonstrá-los. [13] Daí nasceu a idéia de que as pessoas precisavam “vestir-se bem” para poder honrar a Deus! A partir de então os membros da igreja adoravam em belos edifícios, exibindo sua roupa formal para honrar a Deus.[14]
William Henry Foote, um Presbiteriano da Carolina do Norte, seguindo fielmente os passos de Bushnell, escreveu em 1846: “As pessoas que vão à igreja gostam de roupas finas”.[15]
Esta regra simplesmente sedimentou o ritual do uso de roupa formal na igreja. Esta tendência foi tão poderosa que, entre 1850-60, mesmo os Metodistas que “resistiam à roupa formal” foram absorvidos pela moda. Até mesmo eles começaram a usar “roupa dominical” para ir à igreja. [16]
A conseqüência de tudo isso, como virtualmente ocorreu com as demais práticas adotadas pela igreja, foi a adoção da roupa formal na igreja devido à influência do entorno cultural na prática cristã. Hoje, querido cristão, as pessoas vestem “a melhor roupa” para ir à igreja nas manhãs dominicais sem nem mesmo saber a razão. Mas agora você sabe de toda história que se esconde por trás desse costume estúpido.
Foi o resultado final dos esforços da classe média do século XIX em imitar seus contemporâneos da rica aristocracia, alardeando sua melhora de qualidade de vida pela roupa. (Este esforço também se relaciona à noção vitoriana de respeito). Em outras palavras, vestir “roupa dominical” é simplesmente um subproduto da cultura secular. Isto nada tem a ver com a Bíblia, com Jesus Cristo ou com o Espírito Santo!
Mas o Que há de Mal com a Roupa Social?
O quê dá tanta importância ao ato de “vestir-se bem” para ir à igreja? Concordo que esse tema não aborda uma questão candente. De fato, eu não me preocupo muito com o modo das pessoas se vestirem para ir à igreja. A questão candente surge com relação ao significado da “roupa fina” dentro da igreja.
Primeiramente, esta atitude reflete uma separação entre o secular e o sagrado. Acreditar que Deus se preocupa com a roupa fina que você coloca para “visitar-lhe” é uma violação do novo Pacto. Temos acesso à presença de Deus em todo momento e circunstâncias. Na verdade, será que Ele espera que nós, na condição de Seu povo, nos vistamos domingo pela manhã como se fôssemos para um concurso de beleza?
Em segundo lugar, vestir roupa chamativa e luxuosa aos domingos pela manhã transmite uma falsa mensagem: Aquela igreja é o lugar onde os cristãos escondem sua verdadeira cara, “vestem-se bem” para parecerem agradáveis e belos.[17] Medite sobre estas coisas. Colocar sua “melhor roupa” aos domingos não é outra coisa senão criar uma impressão. Isso dá à casa de Deus todos os elementos de um teatro: Guarda-roupa, maquilagem, acessórios, luzes, porteiros, música especial, mestre de cerimônias, cargos, programa principal.[18]
O hábito de usar “roupa dominical” na igreja viola a realidade de que a igreja é composta por pessoas reais com problemas de difícil solução. Podem ser pessoas reais envoltas em disputas conjugais, mas que após saírem do estacionamento e entrarem pela porta da igreja cobrem-se com grandes sorrisos!
O ato de vestir-se socialmente aos domingos oculta um problema básico subjacente. Fomenta a ilusão arrogante de que somos “bons” porque nos vestimos bem para Deus. É uma pretensão que desumaniza e constitui um falso testemunho diante do mundo.
É necessário reconhecer que como seres humanos decaídos são raras as vezes que estamos dispostos a mostrar aquilo que realmente somos. Quase sempre contamos com nossa performance ou aparência (roupa) para fazer com que os outros pensem coisas agradáveis a nosso respeito. Tudo isso é bem diferente da modéstia característica da igreja Primitiva.
Em terceiro lugar, “vestir-se socialmente” para ir à igreja é o mesmo que dar uma bofetada na simplicidade (marca registrada da Igreja Primitiva). Os cristãos do primeiro século não procuravam “vestir-se bem” para atender aos encontros da igreja. Eles se reuniam na simplicidade de suas casas.
Não se vestiam para mostrar a que classe pertenciam. Na realidade, os primeiros cristãos faziam esforços concretos para mostrar seu absoluto desdém pelas distinções sociais. [19]
Na igreja, todas as distinções sociais eram apagadas. Os primeiros cristãos sabiam que eles representavam uma nova espécie sobre este planeta. Por esta razão Tiago repreende os crentes que tratam melhor os santos ricos que os pobres. Ele repreende os ricos por vestir-se diferente dos pobres.[20]
Todavia, muitos cristãos mantêm o falso conceito de que é “irreverente” usar roupa informal no culto aos domingos. Isso não difere da atitude dos escribas e fariseus ao acusarem o Senhor e Seus discípulos de “irreverência” por não seguirem as tradições de seus antepassados.[21]
Fonte: Livro Cristianismo Pagão. Origens das Práticas da Igreja Moderna. Frank A Viola. Capítulo 5.
2[2] Max Barsis, The Common Man Through the Centuries (New York: Unger, 1973).
3[3] Leigh Eric Schmidt, “A Church Going People is a Dress-Loving People,” Church History (58), pp. 38-39.
4[4] Ibid.
5[5] Em 1664 James Hargreaves inventou a “spinning jenny” [máquina de fiar primitiva] disponibilizando às massas um tecido
melhor e mais colorido (Elizabeth Ewing, Everyday Dress 1650-1900, London: Bratsford, 1984, pp. 56-57).
6[6] Richard Bushman, The Refinement of America (New York: Knopf, 1992), p. 313.
7[7] Henry Warner Bowden and P.C. Kemeny, ed., American Church History: A Reader (Nashville, Abingdon Press, 1971), pp.
87-89. A roupa e a hierarquia estavam estreitamente conectadas na América colonial. Um folheto anônimo na Filadélfia em 1722
entitulado The Miraculous Power of Clothes, and Dignity of the Taylors: Being an Essay on the Words, Clothes Make Men sugeria o seguinte: O estado social, posto e poder eram expressos através da roupa. A conexão entre a roupa e a hierarquia na sociedade colonial imprimiu às roupas um poder simbólico. Tal mentalidade eventualmente contaminou a igreja cristã.
8[8] Rupert Davies, A History of the Methodist Church in Great Britain (London: Epworth, 1965), p. 193; Journals of Wesley,
Nehemiah Curnock, ed. (London: Epworth Press, 1965), p. 193. O ensinamento de Wesley sobre roupas foi chamado de “evangelho da simplicidade”. A mensagem principal dele era de que os cristãos deveriam vestir-se de uma forma modesta, limpa e simples. Wesley falava tão freqüentemente sobre este assunto que se atribuiu a ele a seguinte frase: “A limpeza e a santidade andam juntas”. Porém, essa frase vem de um rabino (Phinehas Ben-Yair, Song of Songs, Midrash Rabbah, I.1:9).
9[9] “A Church Going People is a Dress-Loving People,” p. 40.
10[10] The Refinement of America, pp. 335, 352.
11[11] Ibid., p. 350. As denominações com um maior número de membros ricos (Episcopal, Unitariana, etc.) começaram a vender
bancos a famílias ricas para arrecadar fundos para um minucioso programa de construção de igrejas. “Devido ao custo dos bancos, os adoradores tiveram que usar roupas adequadas ao esplendor do edifício e o estilo da congregação para muitos se tornou uma barreira insuperável. Um século antes um fazendeiro comum poderia vestir-se bem indo à igreja com uma camisa azul xadrez. Na atmosfera distinta das novas e luxuosas igrejas requeria-se mais do que isso”.
12[12] Ibid., pp. 335, 342, 346.
13[13] Ibid., pp. 328, 331.
14[14] Ibid., p. 350.
15[15] “A Church Going People is a Dress-Loving People,” p. 36.
16[16] The Refinement of America, p. 319. “Os metodistas primitivos sabiam que a roupa da moda era uma inimiga, mas agora a inimiga estava ganhando”. Schmidt escreveu, “As pessoas preocupavam-se com o Sabbath… com vestir suas melhores roupas; A roupa dominical tornou-se proverbial. Até mesmo os pietistas e evangélicos que tanto insistiam na simplicidade da roupa adotaram roupas formais e “decentes” (“A Church Going People is a Dress-Loving People,” p. 45).
17[17] Deus olha para o coração; Ele não se impressiona com o traje que usamos (1 Sam. 16:7; Lucas 11:39; 1 Pedro 3:3-5). Nossa
adoração é no espírito, não na aparência física (João 4:20-24).
18[18] Christian Smith, “Our Dressed Up Selves,” Voices in the Wilderness (Sept/Oct. 1987), p. 2.
19[19] Em seu livro Ante Pacem: Archaeological Evidence of Church Life Before Constantine (Mercer University
Press/Seedsowers, 1985), Graydon Snyder afirma que há aproximadamente 30 cartas disponíveis escritas por cristãos antes de Constantino. Estas cartas são assinadas apenas pelo primeiro nome, o que indica que os cristãos não usavam os sobrenomes dos seus irmãos. A razão: Assim a origem social deles ocultava-se uns dos outros! (Email privado enviado por Graydon Snyder, 10/12/2001 e 10/14/2001.)
20[20] Tiago 2:1-5. Esta passagem também indica que usar roupa da moda na igreja era uma exceção, não uma regra.
21[21] Marcos 7:1-13.


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